1- Quais foram os principais desafios enfrentados ao liderar o departamento jurídico trabalhista na JBS no Brasil em 2024?
Os principais desafios em 2024 estiveram concentrados na instabilidade normativa e jurisprudencial no âmbito trabalhista brasileiro e na gestão estratégica do contencioso trabalhista em um ambiente regulatório desafiador.
A constante evolução da jurisprudência e as interpretações divergentes em temas centrais, como a aplicabilidade da Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) em contratos anteriores à sua vigência, exigiram um posicionamento técnico rigoroso e a adoção de estratégias jurídicas diferenciadas. Um marco desse esforço foi o êxito em um leading case envolvendo a JBS, que não apenas protegeu os interesses da companhia, mas também estabeleceu um precedente relevante para o setor.
Este caso discutiu a aplicação da Reforma Trabalhista em contratos de trabalho celebrados antes de novembro de 2017, com potencial impacto em todos os empregados admitidos antes dessa data. A decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) trouxe maior segurança jurídica ao reafirmar a aplicabilidade da reforma para todos os contratos, garantindo a uniformidade e o respeito à integralidade da legislação.
Outro ponto desafiador foi assegurar que os fluxos e processos internos do departamento jurídico fossem otimizados para atender à alta demanda, sem comprometer a qualidade das entregas. Isso envolveu a implementação de soluções tecnológicas inovadoras, contratação e capacitação de pessoas e a estruturação de políticas que garantissem a agilidade e eficiência na condução das demandas, sempre alinhadas aos valores institucionais da JBS.
2- Como o setor jurídico da JBS colabora com outras áreas para garantir uma atuação ética e em conformidade com a legislação?
O departamento jurídico da JBS, incluindo a gestão trabalhista, atua de forma integrada com áreas estratégicas como Recursos Humanos, Compliance e Sustentabilidade. Essa sinergia é essencial para garantir que todas as decisões sejam tomadas em plena conformidade com a legislação vigente e em alinhamento com os valores éticos da companhia.
Um exemplo marcante dessa colaboração é o trabalho da Área de Conformidades Legais, uma equipe multidisciplinar composta por advogados, ergonomistas e engenheiros de segurança de trabalho, criada em 2015 com o objetivo de reforçar a atuação preventiva no âmbito trabalhista. Essa área realiza visitas técnicas às unidades operacionais, promovendo análises minuciosas de processos e práticas para identificar potenciais riscos e oportunidades de melhoria. Essas avaliações têm permitido à JBS adotar medidas corretivas e preventivas, reduzindo a exposição a passivos trabalhistas e fortalecendo a cultura de conformidade em todas as operações.
3- Como sua equipe aborda a gestão de litígios trabalhistas, considerando o tamanho e a quantidade de funcionários na empresa?
A gestão de litígios trabalhistas na JBS é estruturada para lidar com a alta complexidade e volume de demandas, reflexo direto de sermos a maior empregadora privada do Brasil, com mais de 170 mil colaboradores. Essa realidade exige uma abordagem estratégica que combina dimensionamento adequado de equipe, uso de tecnologia e iniciativas inovadoras.
Nosso time de gestão interna é organizado para atender de forma integrada e personalizada as necessidades de cada unidade de negócio, garantindo agilidade e assertividade na condução dos casos. Um destaque importante é o Núcleo de Advocacia Empresarial (NAE), criado em 2016, que seleciona e capacita advogados para atuarem diretamente no contencioso trabalhista. Com atuação distribuída em mais de 10 cidades, esses profissionais patrocinam aproximadamente 20% dos processos da companhia. Essa iniciativa proporciona maior controle e eficiência, além de reforçar o alinhamento estratégico entre as práticas jurídicas e os objetivos corporativos.
Além disso, o contencioso trabalhista da JBS se beneficia de um sistema robusto de gestão processual, integrado a tecnologias avançadas de automação, inteligência artificial e jurimetria. Essas ferramentas auxiliam na triagem, classificação e acompanhamento dos processos, proporcionando informações estratégicas e embasadas em dados para a tomada de decisões. A jurimetria, em particular, é utilizada para identificar tendências, prever desfechos e embasar estratégias jurídicas com base em análises estatísticas, contribuindo para uma gestão proativa e focada na mitigação de riscos. Essa combinação de competências humanas e inovação tecnológica assegura a excelência na condução das demandas trabalhistas.
4- Como o setor jurídico trabalhista do Brasil interage com os times jurídicos de outras localidades onde a JBS opera?
Como uma multinacional brasileira, um fato do qual temos muito orgulho, o departamento jurídico trabalhista no Brasil é significativamente mais robusto devido à complexidade e especificidade da legislação trabalhista brasileira. Essa estrutura nos permite enfrentar os desafios locais de maneira eficiente e estratégica.
Fora do Brasil, onde a legislação trabalhista e os sistemas jurídicos variam significativamente de país para país, cada departamento jurídico local possui autonomia para gerir suas demandas de acordo com a legislação e as particularidades locais.
Essa abordagem permite que a JBS respeite as particularidades regulatórias de cada mercado, ao mesmo tempo em que mantém uma governança global consistente e alinhada com seus valores corporativos.
5- Na sua visão, quais tendências estão moldando o futuro do trabalho e das relações jurídicas nas grandes corporações?
A evolução do trabalho e suas relações jurídicas refletem a constante adaptação da sociedade às mudanças culturais, econômicas e tecnológicas.
No futuro, uma das principais tendências será a crescente integração da inteligência artificial (IA) e de outras tecnologias avançadas nos ambientes de trabalho. Essas ferramentas não têm como objetivo substituir o ser humano nas atividades, mas sim auxiliá-lo, permitindo maior eficiência e qualidade na execução das tarefas.
No entanto, a adoção dessas inovações traz consigo o desafio de capacitar os profissionais para utilizá-las de forma eficaz em suas rotinas. É essencial investir em treinamento e desenvolvimento, assegurando que os colaboradores compreendam e dominem essas tecnologias. Além disso, a evolução tecnológica exigirá novas regulamentações para equilibrar a inovação com a proteção dos direitos trabalhistas, criando um ambiente que valorize tanto o avanço tecnológico quanto o papel indispensável dos profissionais.
Grandes corporações, como agentes de transformação, têm a responsabilidade de liderar a criação de políticas internas que regulamentem o uso de tecnologias emergentes, assegurem condições justas de trabalho e respeitem os princípios éticos. O papel das áreas jurídicas será fundamental nesse processo, não apenas na interpretação e aplicação das normas vigentes, mas também na proposição de soluções inovadoras que promovam a conformidade e a sustentabilidade das relações de trabalho.