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Inovação & PI

‘Com novas tecnologias, surgem oportunidades que vão além da tradução tradicional’

Paulo Guimarães é presidente da BLISS - Brazilian Language Industry Association, associação que reúne prestadores de serviços linguísticos no país. Nesta entrevista, ele aborda o impacto das soluções de IA em trabalhos de tradução e como o setor pode se empoderar com estas inovações

Como você avalia o mercado de serviços linguísticos no Brasil?

O mercado de serviços linguísticos é altamente fragmentado em todo o mundo, e no Brasil não é diferente. O ciclo mais comum ocorre quando um tradutor experimenta um aumento na demanda por seus serviços e decide desenvolver sua própria empresa. Atualmente, temos algumas empresas de grande porte no Brasil, mas a maioria do setor é composta por pequenas empresas e microempreendedores.

Em relação ao tamanho das empresas, há poucas pesquisas detalhadas sobre o mercado brasileiro. Alguns estudos relevantes incluem a pesquisa da Nimdzi Research, que focou no mercado brasileiro em 2021, e o relatório anual da CSA Research, que oferece um panorama da América Latina. Um dos principais objetivos da BLISS é justamente contribuir para a construção dessa visão do mercado, demonstrando sua força tanto para clientes nacionais quanto internacionais.

 

Como o avanço das ferramentas de inteligência artificial e tradução automática têm impactado a atuação de profissionais de tradução?

O nosso mercado lida com essas ferramentas há muito tempo. O desenvolvimento das primeiras tecnologias de auxílio à tradução remonta à década de 1980, quando surgiram as primeiras memórias de tradução e ferramentas de gestão de glossários. Com o tempo, essas tecnologias evoluíram e se popularizaram.

A tradução automática e sua revisão foram introduzidas no mercado sob o conceito de pós-edição, e a tradução automática neural (NMT) ganhou força especialmente após seu lançamento pelo Google. Como se pode observar, a atuação dos profissionais de tradução vem passando por mudanças há pelo menos 40 anos, com um impacto mais intenso no exterior e, posteriormente, no Brasil, à medida que as exigências dos clientes evoluíram.

Com o surgimento dos LLMs (Large Language Models), o impacto dessas tecnologias se aprofundou, afetando não apenas a tradução, mas diversas outras profissões. Hoje, o profissional da área precisa estar atento e preparado para se adaptar às novas exigências do mercado.

 

Como o uso destas ferramentas de tecnologia pode agregar valor ao trabalho dos tradutores?

Uma coisa é certa: o profissional que souber utilizar essas ferramentas a seu favor estará à frente no mercado. A área da tradução é dinâmica, e as mudanças vêm ocorrendo há décadas. No passado, aqueles que dominaram o uso de memórias de tradução e glossários conseguiram aumentar significativamente sua produtividade.

Com as novas tecnologias, surgem oportunidades que vão além da tradução tradicional. O uso de LLMs como suporte ao controle de qualidade tem se mostrado uma tendência especialmente forte na área de software. No entanto, o principal diferencial continua sendo a capacidade do profissional de interpretar e validar os resultados gerados pelas máquinas. Nesse contexto, a especialização se torna ainda mais essencial.

 

Em relação à tradução jurídica – desde contratos até peças processuais –, quais são os principais desafios para profissionais da área?

O principal desafio na tradução jurídica é a especialização. O conhecimento aprofundado dos diferentes jargões jurídicos em cada país é extremamente valioso, pois os sistemas jurídicos variam significativamente, assim como sua terminologia.

A língua é viva, e mesmo entre países que compartilham o mesmo idioma, há diferenças nos termos técnicos e no uso da linguagem jurídica. Isso significa que, ao traduzir uma peça jurídica do português para o inglês, por exemplo, o resultado será diferente dependendo do público-alvo, seja para os Estados Unidos ou para o Reino Unido, devido às variações terminológicas entre os sistemas jurídicos desses países.