favicon
ESG

'O racismo sempre esteve velado nas minhas relações empreendedoras'

No Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, entrevistamos Andreia Oliveira, CEO da iBench, startup dedicada a facilitar compras de produtos laboratoriais. Ela fala sobre sua trajetória acadêmica e todos os desafios no enfrentamento ao machismo e ao racismo no mercado.

Nesta terça-feira, 25 de julho, se celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latino e Caribenha, criado pela ONU em 1992. Face à data de celebração e reflexão, conversamos com Andreia Oliveira, biomédica, PhD, fundadora e CEO da iBench. Sua trajetória acadêmica e à frente da startup, que se dedica a facilitar o acesso a produtos por laboratórios, traz à tona uma série de questões relacionadas aos avanços necessários por equidade racial e de gênero.

Como foi a sua trajetória até se tornar CEO da iBench?

Segui uma carreira acadêmica tradicional. Após, a faculdade de Biomedicina, segui com Mestrado e Doutorado em Bioquimica, todos pela UFRJ. No meio do doutorado eu tive a oportunidade de fazer um sanduíche na Saint Louis University, USA, e lá meus olhos abriram e muitas ideias floresceram. Voltei! E depois pós-doc, percebi que eu tinha que fazer algo pela ciência. Mas ainda não sabia como. Sempre falava com amigos da faculdade que eu queria abrir uma lojinha de materiais de laboratório no Fundão (UFRJ). Mas a minha futura sócia Débora Moretti, me ensinou que isso não era escalável. A ideia ficou adormecida. Fui para a indústria e, um dia, a Débora me liga: “Andreia, chegou a sua hora”. O CNPq tinha aberto uma chamada para startups de base tecnológica e lá fui eu. Escrevemos o projeto e com apenas uma ideia fomos uma das startups selecionadas. Assim, nasciam a iBench e a Andreia empreendedora. Sem conhecimento de negócios, mas com uma vontade de fazer algo novo, diferente e escalável nos processos que acontecem em todos os laboratórios do mundo. Queríamos eliminar a burocracia de compra de insumos de laboratório, queríamos ser a Amazon da Ciência.

Você enfrentou situações de racismo na sua trajetória? Se sim, como você mediou a situação?

O racismo sempre esteve velado nas minhas relações empreendedoras. Primeiro, que o ambiente na época, 2018, nem tanto tempo assim, era muito masculino, ainda é. Investidores, líderes, mentores e próprios CEOs das startups, quase nenhuma representatividade feminina e muito menos negras. Participei de alguns programas de aceleração e sentia essa dominação, principalmente em bancas de pitch. Ou seja, neste momento, tinha que dar 150% de mim, e não 100%, pois era tudo uma questão de provar que eu era capaz. Uma vez, me convidaram para um evento em Curitiba, sou do RJ, para receber um prêmio representando startups que eram lideradas por mulheres. Sabe, qual foi o prêmio? Um caixa rosa cheia de brownies! Se fossem homens, esse seria o prêmio? Sabe, faltou uma sensibilidade ali. Não era um concurso de melhor doceira (sem julgamento). Eu estava ali representando muitas mulheres empreendedoras no campo da tecnologia. Outra vez, perguntei para um investidor famoso no RJ por que eles investem tão pouco em ideias de mulheres. Ele me respondeu, porque as mulheres não enviam as suas ideias. Ah, colei nele, e toda vez que tinha uma ideia, mandava para ele.

Como mulher negra em uma posição de liderança, como você enxerga o seu papel dentro de uma pauta tão sensível como o racismo?

Eu vejo com uma oportunidade de desempenhar um papel na promoção da igualdade racial, criando ambientes inclusivos e na implementação de mudanças dentro das organizações. Eu sempre tive o olhar para criar um time diverso. E foi muito bom compartilhar com o time perspectivas únicas, experiências pessoais e impactar pessoas, principalmente promovendo a diversidade e equidade.

Hoje se celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. Quais as reflexões que esta data pode suscitar?

Eu enxergo como o dia para refletir sobre a ampliação da nossa representatividade. É um momento para fortalecer alianças, ouvir e aprender com as experiências de outras mulheres negras. Então o diálogo e o ativismo precisam estar presentes para empoderar as mulheres negras latino-americanas e caribenhas.

O que podemos esperar da iBench nos próximos períodos?

A iBench foi uma das melhores coisas que aconteceram na minha vida. Eu cresci em 4 anos e me transformei! Neste momento, demos uma pausa nas operações da iBench para nos dedicar a outros projetos de vida pessoal. Mas continuamos pensando em como ser voz neste mundo empreendedor e facilitadoras no ambiente científico trocando ideias e promovendo a inovação. Quem sabe, surge algo novo por ai!?