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ESG

'Pessoas LGBTQIAP+, via de regra, são mais testadas'

Luciano Inácio de Souza, sócio do Cescon Barrieu, é o sexto entrevistado da série Especial do Orgulho

Em sua contribuição para o Especial do Orgulho, Luciano Inácio de Souza, sócio do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados, fala sobre a evolução da representatividade de pessoas LGBT+ no mercado jurídico.

“Hoje já vemos naturalmente sócios e sócias LGBTQIAP+ em grandes escritórios brasileiros, liderando transações complexas, atuando em casos de grande impacto para todo o mercado. Aqui mesmo no Cescon temos sócios e sócias pertencentes à comunidade, inclusive na governança do escritório. Precisamos cuidar para que os profissionais da base, que estão chegando agora no mercado, sintam que o mercado também é para eles, que podem progredir sem deixar de ser quem eles são”, afirmou.

A série traz entrevistas com sócias e sócios dos principais escritórios de advocacia brasileiros, para analisar o panorama da diversidade, em vista do Dia Internacional do Orgulho LGBT+, celebrado neste 28 de junho.

 

Leia na íntegra:

Hoje é o Dia Internacional do Orgulho LGBT+. O que há para se comemorar?

Só por estar aqui falando dessa pauta como um sócio já é um avanço muito grande se pensarmos 10 anos atrás, e merece destaque se considerarmos o universo jurídico. Sim, há o que se comemorar, mas claro, com reservas. De fato, temos diversas conquistas nos últimos anos que nos permitem analisarmos o cenário em uma perspectiva mais ampla e concluirmos que avançamos em diversas frentes. Obviamente, precisamos estar sempre atentos porque as conquistas vieram depois de muita luta, do trabalho de décadas de muitas pessoas e movimentos. Mas tudo isso, desde a construção dos meios que nos permite avançarmos para direitos à comunidade LGBTQIAP+ até a vigilância necessária para que não demos passos para trás, é uma construção social e depende de diversos fatores.

 

Qual sua percepção sobre o atual panorama de direitos LGBT+?

Nós tivemos avanços jurídicos importantes para a população LGBTQIAP+ nos últimos anos no Brasil, vindos principalmente do Poder Judiciário. O Brasil é um país bastante diverso também em termos de orientação sexual e identidade de gênero. No entanto, existem alguns paradoxos. Por exemplo, ao mesmo tempo em que temos a maior parada de diversidade sexual do mundo – em São Paulo -, somos o país que mais mata travestis e transexuais por crime de ódio. Então, temos muito a fazer em termos de conscientização e educação. Felizmente, há diversas entidades realizando trabalhos importantes no atendimento e na acolhida, sobretudo aos LGBTs em maior situação de vulnerabilidade, e de maneira geral todas as organizações e empresas podem contribuir.

 

Quais foram os seus principais desafios profissionais como uma pessoa LGBT+?

Como todo profissional não vou negar que tive receio no início da carreira. Porém, acredito que eu tenha sido uma pessoa que encontrou os lugares certos e acolhedores para trabalhar, e, por essa razão, não tive problemas em falar sobre isso durante a construção da minha carreira. Claro que nós ouvimos uma ou outra piada, algum comentário maldoso, mas nada que me afetasse a ponto de me fazer repensar projetos ou que me impedisse de atender bem meus clientes. Pessoas LGBTQIAP+, via de regra, são mais testadas, a gente estuda muito, não aceitamos não conseguir fazer uma entrega. No Cescon Barrieu, olhamos para o tema com importância pensando em aspectos de diversidade, equidade e inclusão. A jornada é longa, mas precisamos manter a consistência.

 

Quais são as particularidades para profissionais LGBT+ no mercado jurídico, principalmente na área de Compliance, na qual você é ranqueado pela Leaders League?

Comecei minha carreira atuando na área concorrencial e migrei, posteriormente, para compliance e relações governamentais. Mas vejo que os desafios para as pessoas LGBTQIAP+ são semelhantes no mercado jurídico como um todo. Assim como na sociedade de maneira ampla, podemos dizer que avançamos muito nos últimos anos. Talvez os passos sejam lentos e essa seja a forma que a gente vai conseguir avançar, ocupar brechas, suprir algumas lacunas e mostrar a importância da diversidade sexual também no meio jurídico. Hoje já vemos naturalmente sócios e sócias LGBTQIAP+ em grandes escritórios brasileiros, liderando transações complexas, atuando em casos de grande impacto para todo o mercado. Aqui mesmo no Cescon temos sócios e sócias pertencentes à comunidade, inclusive na governança do escritório. Precisamos cuidar para que os profissionais da base, que estão chegando agora no mercado, sintam que o mercado também é para eles, que podem progredir sem deixar de ser quem eles são.

 

Como o Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados trata temas de diversidade? Existem políticas específicas para grupos minoritários?

Esta pauta é muito importante no Cescon Barrieu e, sim, existem programas. O escritório tem um Comitê de Equidade, que foi reformulado em 2018 e passou a ter quatro frentes: Mulheres, LGBT+, Étnico-racial e PcD. Em 2023, tivemos a adição de uma nova frente: Liberdade Religiosa. Cada um dos grupos se reúne de maneira periódica a fim de impulsionar iniciativas que possam criar e promover um ambiente profissional plural e inclusivo no escritório; conscientizar todos os nossos colaboradores sobre o tema, permitindo que essas discussões transcendam o escritório e desenvolver uma rede de apoio entre os integrantes da banca.

Confira as outras entrevistas da série:

Falando especificamente da Frente LGBT+, temos algumas ações internas:

– Rodas de conversa periódicas. O objetivo é conscientizar o time a partir de conversas abertas e amplas, depoimentos, discussão sobre casos e temas recentes.

– Também fazemos o Cine Pipoca, com a exibição de vídeos, filmes e documentários relevantes, que são acompanhados de uma discussão ao final

Na frente externa, desenvolvemos vários projetos interessantes:

  1. Projeto-piloto Embrace Initiative. Esta ação é realizada em parceria com Goldman Sachs, Instituto Social Ser Mais, Cogna Educacional, EF – Education First e Frame Mentoria. O objetivo é ampliar a formação de pessoas trans e oferecer oportunidades de interação com outros profissionais. O projeto já concedeu 12 bolsas de estudos a pessoas autodeclaradas transgênero, para cursos de ensino superior tecnólogo e inglês, com duração de dois anos. O Cescon Barrieu participa ativamente da coordenação deste projeto e também disponibiliza mentores.
  2. o Projeto Potência Trans é muito relevante. Ele está sendo desenvolvido no biênio 2023-2024 com diversos parceiros, entre eles Actio Desenvolvimento Humano, Instituto Social Ser Mais e Cogna Educacional. Assim como o Embrace Initiative, o objetivo do Potência Trans é oferecer bolsas de estudo para pessoas trans em cursos tecnólogos e de inglês.
  3. o TRANSforma é outra iniciativa importante que tem o nosso apoio. O escritório patrocina financeiramente o projeto, desenvolvido em parceria com a Casa Chama, que busca auxiliar na retificação de nome e gênero de pessoas trans, assegurando mais dignidade e também reconhecimento jurídico-social. Participamos ativamente desta iniciativa que já permitiu a 20 pessoas trans a retificação de seu nome e gênero em apenas um ano.
  4. Vale destacar também um projeto que desenvolvemos desde 2023. É o projeto Cescon Barrieu Cidadania, que em São Paulo temos parceria com a Casa1, uma casa de acolhimento para pessoas LGBT+ que tiveram que sair de suas casas em razão da orientação sexual e/ou diversidade de gênero. Nosso projeto busca orientar a população LGBTQIAPN+ em situação de vulnerabilidade socioeconômica sobre os seus direitos básicos. Mensalmente, advogados do escritório vão até a Casa1 e fazem orientações jurídicas para as mais diferentes demandas voltadas aos direitos básicos. Nosso objetivo é expandir o projeto para todas as cidades onde temos escritório.